Quanta pretensão achar mesmo que seria a mulher da sua vida,
que iria acordar todos os dias sentindo o cheiro bom que o seu pescoço tem,
pensar que enxergaria a beleza e a leveza de viver todos os dias no verde
amarelado dos seus olhos que insistem em brilhar até quando não se tem sol.
Quanta pretensão minha! Achar mesmo que você poderia ser o homem da minha vida,
aquele que seria o pai do meu filho, que teria seu nome e seus olhos, que iria
gostar de futebol e filosofia. Quanto pretensão vislumbrar você sendo dono das
minhas alegrias, das minhas calopsitas, da minha gargalhada alta e de tudo mais
que for meu. Quanta imaturidade pensar que poderia ser de alguém e não apenas
minha, que poderia ser pra sempre e sem fim, com amor e de verdade.
Pobre menina, deve pensar a senhora que faz cooper e me olha
de longe curiosa durante meus cinco minutos de luto diário. Tão jovem, tão
linda poderia estar aproveitando o sol, curtindo a doçura dos vinte e poucos
anos, mas não, dia após dia sentada nesse banco velho vendo árvores. Que graça
tem apenas olhar? "Se eu não tivesse marido e filhos? Ah minha filha eu
estaria dançando coladinho com algum rapaz novo e bonito!", me disse um
dia entre uma e outra volta apressada. Se eu não tivesse esse amor dentro de
mim, se eu não desejasse apenas um corpo, apenas um rapaz, se não enxergasse
beleza apenas em um ser nessa terra, se não tivesse ouvidos apenas pra uma
música. Se eu soubesse ao menos dançar! Quis responde-la, apenas quis.
Dia após dia, noite após noite, semestre após semestre você
aqui em todos os lugares da casa que nunca conheceu. Em todos os lugares do
corpo que talvez nem lembra mais. Em todos os planos e sonhos de futuro as
quais nunca vai saber. Em todos os textos que talvez nunca leia. A saudade deve
ser isso, conviver com a ausência que insiste em sobreviver. Arrumar o quarto
para aquele que nunca virá. Ensaiar diálogos que nunca serão ditos. Noites de
amor que nunca serão gozadas. Dia após dia você vivendo em mim. Dia após dia eu
sendo sua, mesmo sem pertencer. Dia após dia sentada em bancos, observando senhoras
passarem, carros rodarem, passarinhos cantarem e vidas acontecerem lembrando
suas frases sussurradas no meu ouvido e como sua voz era doce falando meu nome:
eni... eni... Dia após dia eu sendo sua eni, apenas sua, estacionada, parada em
uma dor que não cessa. Enguiçada em um sentimento que não se esvai. A espera,
apenas.
Outro dia cheguei de tênis. Andei timidamente em meio às
senhoras, ouvi histórias engraçadas de penetra entre uma e outra ultrapassagem,
mas me movi. À noite o sono veio mais leve, o corpo cansado venceu a vontade de
sofrer por saudades e dormi uma noite inteira.Depois disso, dia após dia e eu
correndo dando voltas na nossa praça, na rua, no bairro. Dando voltas na pista
de corrida da universidade. Cansada. Exausta. Sofrendo diferente. Chorando
através do suor, olhando no espelho e me sentindo mais linda e atraente pra
você. Mordendo travesseiros madrugada adentro pra
disfarçar a dor do não ter. Esperando dia após dia por você... Até que um dia,
entre uma e outra corrida, entre uma e outra olhada no espelho talvez eu me
pergunte quem afinal é você... Quem foi você... Quem era você. Você? Quem
mesmo?
Nayara Fontenele
Ótima parceria!
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